Quem tenta ajudar uma
borboleta a sair do
casulo a mata.
Quem tenta ajudar um broto a
sair da sua
semente o destrói.
Há certas coisas que não
podem ser ajudadas.
Tem que acontecer de
dentro para fora.
Tem que acontecer de
dentro para fora.
[Rubem Alves]
Sementes (Pinhão) de Araucária Angustifolia Brasiliensis
Tal é nossa vida real: somente através de nossos próprios
esforços conseguiremos superar naturalmente todos os obstáculos, ultrapassar as
pontes sobre os rios de águas turbulentas e aos poucos aprenderemos a nos
locomover, andar e voar.
Esta pequena prosa a seguir, já a li de várias formas e
adaptações, em vários estilos de narrativa, mas sempre conservando a mesma
essência da maravilha embalada pela naturalidade da Criação. Farei de memória o
que dela pude reter.
(") Era uma vez uma manhã em que eu descobri um casulo
pendente em um galho de árvore, no momento em que a borboleta se esforçava para
romper o invólucro de sua cela de transmutação e se preparava para sair. O Tempo da Natureza
é lento perante a nossa ansiedade. Estava demorando muito, e eu - como todos os humanos - feitos de
impaciência e pressa, retirei o casulo de seu lugar.
Impaciente, quebrei o ramo em que pendia o casulo, semelhante
a um brinco caprichosamente feito de jade e rubi e comecei a bafeja-lo. O
hálito, mais quente que a superfície do casulo acionou alguma reação física e orgânica
do ser vivente em seu interior, e o fenômeno da vida começou a acontecer
perante meus olhos - o que deveria prever pela minha interferência - mais
rápido que o natural.
O receptáculo do pequeno ser se abriu: era uma borboleta.
Começou forçosamente a tentativa de ingressar na jornada pela vida. Notava que
seu esforço e dificuldade estavam além do fenômeno de seu nascimento natural.
Suas asas não se abriam, amarrotadas e grudadas ao corpo; estava se arrastando.
Algo incomum - e eu sabia qual - havia interferido no ciclo normal evolutivo de
sua formação. Jamais irei esquecer o horror e culpa da minha intrusão no
processo de vida daquele animalzinho: suas asas ainda não estavam prontas e
desfraldadas a contento, e todo o seu corpinho frágil fremia, a exaustiva
tentativa era para desdobrá-las.
Curvado, ajoelhado no solo, eu com minha ignorância pensava que a ajudaria com o inútil bafejar do meu
hálito. Claro que era em vão! Quebrei exatamente com o bafejar humano o
fenômeno - natural da vida e o desenvolver das asas - fenômeno este feito
minuciosamente de forma lenta pelo relógio da natureza e ao sol. Eu quebrei o
elo do sagrado passo a passo que rege as existências - expulsei a vida e lhe
chamara a morte. Qualquer ingerência agora era tarde demais.
Meu hálito obrigara aquela que seria uma linda borboleta azul
com fímbrias em ouro, a se apresentar para o mundo dos insetos e da natureza toda
disforme, prematura ao seu exato tempo biológico de formação. Ela se
convulsionou em desespero, e totalmente incapaz viveu frações de tempo;
seguidos de mais alguns segundos morreu sobre uma folha a que julguei piedade em lhe dar por cama.
Jamais poderia ter acionado o gatilho daquele processo de
nascimento, que na verdade era um exercício de fortalecimento corporal e
aprendizado. A borboleta ainda não era um ser completo e acabado. Cada ser
animal tem seu tempo próprio de formação e inclusão na vida. Abandonar sua
etapa anterior, o casulo, somente poderia fazê-lo na hora e tempo em que
estivesse apta para alçar seu voo. Tudo segue o ritmo ditado pela etapa
anterior, não forçosamente, de forma intempestiva, com pressa, impacientemente.
De resto, toda vida em suas diversas espécies na Terra há que seguir o
ritmo do Eterno. O homem com sua interferência na Natureza está colocando
milhares de espécies animais e vegetais na lista vermelha da extinção, inclusive a si próprio.
Muitos
espécimes, em breve não mais existirão, outros nossos filhos ou netos somente os
conhecerão em documentários ou por fósseis. Por causa e culpa da ingerência do
homem naquilo que tem na Natureza seu Tempo exato, e no habitat sua defesa. As araucárias vêm da era dos dinossauros, há espécimes de 700 anos e até mais (O "Pinheiro Grande" de Canela no Rio Grande do Sul) e o homem os abatem com uma motosserra em no máximo 10 a 15 minutos.
Tudo tem (ou deveria que deixassem ter) seu Tempo certo debaixo do Sol.
Desenho de M. Martins Santos, Fund. e Administrador deste Blog
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