quarta-feira, 4 de outubro de 2017

DA BORBOLETA À SEMENTE




DA BORBOLETA À SEMENTE



Quem tenta ajudar uma borboleta a sair do 
casulo a mata.
Quem tenta ajudar um broto a sair da sua
semente o destrói.
Há certas coisas que não podem ser ajudadas.
Tem que acontecer de 
dentro para fora.


[Rubem Alves]



Sementes (Pinhão) de Araucária Angustifolia Brasiliensis



 Às vezes até  parece-nos não ser verdade tudo o que  passamos pelas adversidades da vida. Uns mais, outros menos, de acordo com as situações vivenciadas e como tivemos que aprender a lidar sozinhos com elas, no ar, sobre as águas, ressacas e ciclones, fogo e assaltos, nas guerras urbanas, as internacionais que os mandatários nos arrumam e conseguimos sobreviver até aqui. Graças à bondade divina que nos fortalece nos orienta e nos guarda. Talvez muitos não acreditem - exatamente porque tem de fato origem em um Poder Incrível.

Tal é nossa vida real: somente através de nossos próprios esforços conseguiremos superar naturalmente todos os obstáculos, ultrapassar as pontes sobre os rios de águas turbulentas e aos poucos aprenderemos a nos locomover, andar e voar.

Esta pequena prosa a seguir, já a li de várias formas e adaptações, em vários estilos de narrativa, mas sempre conservando a mesma essência da maravilha embalada pela naturalidade da Criação. Farei de memória o que dela pude reter.

(") Era uma vez uma manhã em que eu descobri um casulo pendente em um galho de árvore, no momento em que a borboleta se esforçava para romper o invólucro de sua cela de transmutação  e se preparava para sair. O Tempo da Natureza é lento perante a nossa ansiedade. Estava demorando muito, e eu  - como todos os humanos - feitos de impaciência e pressa, retirei o casulo de seu lugar.

Impaciente, quebrei o ramo em que pendia o casulo, semelhante a um brinco caprichosamente feito de jade e rubi e comecei a bafeja-lo. O hálito, mais quente que a superfície do casulo acionou alguma reação física e orgânica do ser vivente em seu interior, e o fenômeno da vida começou a acontecer perante meus olhos - o que deveria prever pela minha interferência - mais rápido que o natural.

O receptáculo do pequeno ser se abriu: era uma borboleta. Começou forçosamente a tentativa de ingressar na jornada pela vida. Notava que seu esforço e dificuldade estavam além do fenômeno de seu nascimento natural. Suas asas não se abriam, amarrotadas e grudadas ao corpo; estava se arrastando. Algo incomum - e eu sabia qual - havia interferido no ciclo normal evolutivo de sua formação. Jamais irei esquecer o horror e culpa da minha intrusão no processo de vida daquele animalzinho: suas asas ainda não estavam prontas e desfraldadas a contento, e todo o seu corpinho frágil fremia, a exaustiva tentativa era para desdobrá-las.

Curvado, ajoelhado no solo, eu com minha ignorância pensava  que a ajudaria com o inútil bafejar do meu hálito. Claro que era em vão! Quebrei exatamente com o bafejar humano o fenômeno - natural da vida e o desenvolver das asas - fenômeno este feito minuciosamente de forma lenta pelo relógio da natureza e ao sol. Eu quebrei o elo do sagrado passo a passo que rege as existências - expulsei a vida e lhe chamara a morte. Qualquer ingerência agora era tarde demais.

Meu hálito obrigara aquela que seria uma linda borboleta azul com fímbrias em ouro, a se apresentar para o mundo dos insetos e da natureza toda disforme, prematura ao seu exato tempo biológico de formação. Ela se convulsionou em desespero, e totalmente incapaz viveu frações de tempo; seguidos de mais alguns segundos morreu sobre uma folha a que julguei piedade em lhe dar por cama.

Jamais poderia ter acionado o gatilho daquele processo de nascimento, que na verdade era um exercício de fortalecimento corporal e aprendizado. A borboleta ainda não era um ser completo e acabado. Cada ser animal tem seu tempo próprio de formação e inclusão na vida. Abandonar sua etapa anterior, o casulo, somente poderia fazê-lo na hora e tempo em que estivesse apta para alçar seu voo. Tudo segue o ritmo ditado pela etapa anterior, não forçosamente, de forma intempestiva, com pressa, impacientemente.

De resto, toda vida em suas diversas espécies na Terra há que seguir o ritmo do Eterno. O homem com sua interferência na Natureza está colocando milhares de espécies animais e vegetais na lista vermelha da extinção, inclusive a si próprio. 

Muitos espécimes, em breve não mais existirão, outros nossos filhos ou netos somente os conhecerão em documentários ou por fósseis. Por causa e culpa da ingerência do homem naquilo que tem na Natureza seu Tempo exato, e no habitat sua defesa. As araucárias vêm da era dos dinossauros, há espécimes de 700 anos e até mais (O "Pinheiro Grande" de Canela no Rio Grande do Sul) e o homem os abatem com uma motosserra em no máximo 10 a 15 minutos.

Tudo tem (ou deveria que deixassem ter) seu Tempo certo debaixo do Sol.


Desenho de M. Martins Santos, Fund. e Administrador deste  Blog

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