quarta-feira, 14 de maio de 2014

E UMA FORTE CHUVA VAI CAIR.wmv

PROSA PARA PENSAR O ADEUS... A um eterno Amor




PROSA PARA PENSAR O ADEUS... A um eterno Amor.

Lembremo-nos que por vezes, necessitamos de dizer, ainda que por metáforas e parábolas - assim sem se constranger - o que nos é retido na alma. O intransigível existe e contrapõe-se ao nosso campo de emoções positivas, por vezes superáveis, outras nos levam junto ao objeto do amor que se foi.
As pessoas que mais amamos - às vezes achamos - que são as que mais nos decepcionam nos causam espanto ou surpreendem; por julgarmos que são, ou deveriam ser perfeitas e esquecemo-nos fragorosamente que são humanas.
E nisso somos inquietos, imediatistas, egocêntricos e incompreensíveis, na maioria das vezes. Em estudo de causas, se verifica que os desenlaces afetivos recaem sobre esse fato, de partirmos do princípio que (nós) somos produtos acabados, protótipos aos demais semelhantes e que (os outros) nos façam felizes, quando quisermos e não quando eles estiverem também, sido feitos felizes. É isto que escapa aos relacionamentos afetivos e os dentes da engrenagem emocional não se encaixam.
Porém a vida muitas vezes paradoxal, tornasse-nos uma atividade de campo experimental. Somos testados, passados por fogo e caudais. E calculo que realmente seja.
Temos que nos temperar. Diz a lenda do Rei Artur, que o mistério do poder de sua mística espada Excalibur, estava em sua têmpera. Essa lhe dava alma. Nesse entendimento é a inquietação do amor que dá a têmpera e a alma ao universo; o movimento eterno. É a vertigem do amor que faz girar os mundos.
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Se pudéssemos... Ah, se pudéssemos retroagir todas as voltas da espiral do tempo e reencontrar aquele grande amor, isento de culpas, como um dia fôramos os dois... E reiniciarmos a contar as estrelas do ponto onde paramos... No silêncio da noite, a neblina nos evolvendo, a lua viajando serena entre nuvens rendilhadas, no céu polvilhado de pó de prata. Tu buscando abrigo e calor nos meus braços. Estava tão fria a noite... E ao longe alguém talvez amando como nós, ou sofrendo a ausência de seu amor ao som de um violino cantava – no silêncio absoluto da noite – esta canção:

Queima no deserto o inclemente Sol,
Iluminando mais um dos dias esvaídos
Entre dunas e planuras intermináveis...
Minha alma queima a última chama
Para chorar-te sob um céu de estrelas.

Solidão! Meu horizonte é o vasto mundo,
A Levar consigo meus sonhos e deixas,
Flano asas em busca de tua imagem
Viva, sobre a aridez deste meu corpo.
Teu perfume, flagrante lembrança reserva,
E do cansado lamento eu faço segredo.

Tu serás meu refrigério, meu encanto,
Meu celestial poema no tórrido deserto.
Meu oásis; rainha de soberana calma,
Sombra de tamareiras, para minh’Alma!
    
     Ah! Se pudéssemos retornar à grande árvore encantada, coração do jardim de nossos sonhos, descontaminados de todos os pecados que aderiram aos nossos corpos e afetaram nossas almas; modificaram nossas vidas, nossos caminhos, nossos ideais. Ah! Se pudéssemos voltar...
     Estarmos tão puros como ao tempo em que conversávamos em silêncio, por olhares. As batidas do coração comandavam nosso desejo e a emoção. À aproximação de nossos rostos, os corações aceleravam-se, antecipando o beijo e as carícias; intensificava-se teu inconfundível aroma. Teu rosto se aquecia, tua respiração se entrecortava seu hálito era perfumado e quente. Ingressava-me em outro mundo paralelo, do qual não queria mais voltar, queria que se transformasse em um labirinto do qual jamais acharia o retorno. Ali construiríamos nosso mundo, um universo de sonhos. Apossava- me um encanto místico, um sentimento de todo não revelado. E eu indagava solenemente a ti:
     - És às vezes indecifrável, enigmática... Isto me faz teu curioso prisioneiro, refém da busca, da procura de teu interior. Teu exterior, Tua beleza, me seduzem profundamente. Mas que pensas de mim? O  quanto pensas em mim e por onde andas e o que fazes quando estás sem mim? O que almejas da vida seria o mesmo que eu? Por que buscavas a mim no começo de tudo, com tanta insistência amor e sofreguidão?

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      O notável era minha total abstração do desejo de posse de sua liberdade ou o tão desgastado significado [para mim] deste sentimento menor: o ciúme. Meus pensamentos transitavam em outras esferas, embora ainda fossem lá misteriosos os caminhos para mim.
      Porém, a cada encontro toda a mágica se refazia. E eu temia pela sua ausência física. Mas nunca lhe falava desses meus pensamentos. E procurava sempre os assuntos mais alegres, leves e condizentes com a felicidade daquele encontro. Nunca existiu um único desentendimento ao longo de nosso relacionamento.
     O tempo que passava contigo, seria o mesmo tempo cronológico do mundo? Passavam-se horas cronológicas e a teu lado apenas mero segundo. Sentia em minha alma uma sensação de vazio, quando só. Misto de dúvida, afeto e amor. Mas de incompletude. Minha alma estava começando a ficar desolada em separado, necessitava de sua alma junto a mim. E eu próprio me recolhendo da vida lá fora.
     Relutava contra um poderoso e avassalador sentimento, que  seria um sofrimento prolongado, amor excessivo fora das raias da razão. Sabia ainda, que seria uma desmedida paixão que recairia em um possível desgosto, e desalento profundo. 
     Enquanto diagnosticava esses sinais em mim, não percebia “clinicamente” os mesmos sinais nela. Pensei no que a lógica da psicologia afirma: "As pessoas são diferentes..." Sim. Por isso este relato! Caso não o soubesse não teria meios para essas análises paralelas. Descobrira que as pessoas não só são diferentes, como pior, nem sempre congruentes nos finais de sonhos em comum.
     Era ainda esse desconforto, é claro, apenas uma sensação. Mas incômoda. Como nos sonhos, o tempo ao lado dela se desenrolava revelando todo o enredo de nossas vidas. Passado, presente e futuro, pareciam sair da abstração e se materializar em um só fenômeno que não parecia estar caminhando para a ¹Eucatastrofe.
     Muitas vezes abraçados, tinha dentro de mim um sentimento enorme de ternura, quando ela repentinamente tinha um suspiro curto e sentido. Essa reação que remete ao campo das emoções, sempre me foi de difícil compreensão. Talvez por ser uma das coisas que nunca ousamos emitir perguntas sobre a razão. Apenas elas existem e até emolduram uma noite de céu muito estrelado, envolta no intenso perfume de “damas-da-noite”.
     Este cenário, sempre ao atentarmos bem, ele fica místico.
     Ela para mim, deixavas de ser real e comigo entrava em outra dimensão. O nosso amor, envolvia-nos em um turbilhão e nos levava a estágios e pousos de encanto e beleza. Éramos, tomados de uma profunda paz, difícil de descrevê-la. Mas nunca a via sorrindo amplamente, sempre um sorriso esboçado e contido. Não era tristeza, mas era algo que... não oferecia resposta satisfatória para meu íntimo.
     Os pensamentos, que me vinham queimando em chamas, eram por ela rebatidos com afagos suaves, carinhos e meiguice leve. Ficávamos sem palavras, no silêncio - ajeitava-lhe os longos cabelos, alisando-os com as mãos, percorrendo levemente com os dedos os traços lindos de seu rosto, sua boca, seus lábios, contornando-os como se estivesse desenhando uma obra de arte.
   Sua beleza irradiava-se com extrema naturalidade, de cabelos negros bem longos, corte reto; olhos castanhos, magra, não tão alta a ponto de não poder usar saltos “quinze”.
Sem nenhuma das características que marcam as grandes belezas feitas pela mídia (as louras, as ruivas de olhos azuis etc.). Mas ela era, com o conjunto desses traços, de uma forma tão bem distribuída que a faziam a jovem, a mulher, mais linda que já conheci.
     Seus olhos castanhos eram profundos, pareciam ler meu interior, suas sobrancelhas eram usadas praticamente ao natural, sua boca de dentes perfeitos tinha os lábios perfeitamente delineados, e sempre com batom cor- de- carne, com pouco brilho ou opaco. Seus únicos adereços: um anel, uma pulseira de corrente dourada, e um inseparável medalhão preso a uma corrente longa de ouro dourada.

     Ao ser afagado, recebendo seus meigos carinhos, no íntimo eu cismava como se existisse algo acontecendo ou uma barreira invisível em nosso relacionamento. Procurei não pensar mais nisso. Só que, minha imaginação foi se transmudando de abstração para realidade ao correr do tempo. Aqueles carinhos e meigos afagos foram diminuindo de intensidade emotiva. Sentia que não havia “alma” nos abraços, nos beijos. Sentia haver ainda que levemente, um quase imperceptível afastamento. (Só percebido pelos exercícios de meu pensamento).
      Não mais suportando as dúvidas e o grande incômodo que vinha sentindo e os pensamentos que de todos os tipos me assolavam a mente, eu pergunto-lhe se estaria algo afetando os sentimentos em relação a nós... Ela possuía várias características que eu bem conhecia: sinceridade era uma delas; era verdadeira; fiel; sincera; orgulhosa e altiva quando precisava ser. Sabia que me amava de forma extrema quando começamos o namoro. [E pensar que eu antes a ignorava.]
     Era educada e gentil para comigo, sempre. Mesmo sem respostas; aprendemos a decifrar silêncios. Conclui minha pergunta de forma simples: - Por quê?
    - Porque é preciso! - Responde ela com surpreendente serenidade.
    - Explique-se, por favor! Seja mais conclusiva. – disse-lhe.
     Respondeu-me: -  Porque precisamos contar mais estrelas, assistir mais pores- de - sol, nos vermos em meio a mais neblinas de rigorosos invernos, caminharmos sob a chuva fria, dividirmos as mudanças das estações da vida, para podermos compor nosso poema ideal...
     Falava como se estivesse perscrutando a própria alma. Seu olhar era distante, em um horizonte há anos luz de onde estávamos. Como se em seu coração houvessem instalado uma tábula com uma inscrição profética. Era uma sacerdotisa apocalíptica, estava a anunciar vários fins: o meu, o dela, de nossos sonhos mais alentados, a existência de um amor sem precedentes, sem medidas. Eu ia além do amor, a venerava.
   Mas estava a dizer-me adeus? Foi isso que entendera! Ela me amava era certo, mas não podia dizer que ela era daquelas criaturas que poetizam tudo ou filosofam a todo o momento. Era bastante parcimoniosa com seus sentimentos pessoais. Demonstrava fortemente suas emoções por atos e atitudes.
      Essas palavras, não eram de forma corrente usuais dela. Embora fosse muito inteligente. Talvez usasse menos palavras, por sua área escolhida ter sido das exatas que a faziam mais racional, ou por ela ser assim, ter escolhido iniciar-se nesse campo das ciências. Enquanto eu fui para o magistério ela foi para a contabilidade.
     Choramos. Ela chorou muito! Soluçava convulsivamente. Mais explicações não houve. A inteligência e a racionalidade não foram feitas só para constar dos verbetes, foram descobertas para direcionar as pessoas. Temos que saber como agir e se portar diante do inevitável.
     Fatidicamente foi um inacreditável adeus! Amigos em comum ficaram abismados, sem acreditar que isso tivesse acontecido...

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Porém para dois corações apaixonados, não nos esqueçamos de que é da vida cruzar desertos. A busca sempre será a de um oásis onde predomine a verde esperança do poço de águas cristalinas. O perigo é a armadilha da enganosa miragem.
      Procuramos na aventura da vida, a boa ventura da fonte encontrar, para que dela bebamos e sejamos abençoados.
Mas os desígnios do amor nem sempre exige de uma das partes o risco de lançar-se ao desconhecido caminho sem olhar para trás. Nem sempre um dos que se amam - se propõe a acreditar - que se lançando por amor às chamas, ao sumidouro do mar, ao abismo- sem- fundo, possa à vida retornar.
     Foi no primeiro obstáculo, o do deserto, que ela titubeou. Claro que achei normal, tão jovem e frágil em não confiar que eu, apesar de amá-la acima de todas as coisas do mundo, pudesse vir a provê-la de um manancial em pleno deserto!
Não conseguiria jamais fazê-la ser a mesma outra vez. Tinha a certeza!
     Como escrevi depois:
    


- Tornastes uma estrela que se apagou dentro de mim - só tua luz resta a percorrer o universo de minha alma. Não se reconstrói uma estrela jamais. Só a sua luz permanece para toda a eternidade! Por isso fico com tua luz, tua lembrança. Adeus!
     Somente por amor e tão somente, é que nos lançamos aos percalços da vida, com a alma em pedaços, mas sem olhar para trás. Só a soma de dois grandes amores constrói uma paixão, que nos faz morrer por muito amar! Mas aí a vida se refaz e a morte passa a não existir: ser um engodo, uma mentira, frente àquela única verdade o indiscutível e verdadeiro Amor! Morre a estrela fica a sua luz, ali presente a viajar na imensidão do Universo eternamente. Ela não existe mais. Morreu há séculos, milhões de anos, mas ela está presente sempre vista por nossos olhos, sentida por nossa alma, refletindo seu brilho em nosso coração.
     Cerca de quatro anos se passaram depois daquela resposta às minhas perguntas - quando naquela ocasião ela respondeu:
    “Por que é preciso!”        
[...] “Contarmos mais estrelas... Nos vermos em meio a mais neblinas de rigorosos invernos”...
    
     Nada mais tenho a lhes relatar... Sinto-me vazio de ânimo, espírito e palavras.            

Palavras... Palavras... Palavras. Como todas frente ao inaceitável soam sem sentido! Como são destituídas de espírito, fracas, sem importância ou significado... É quando compreendemos a força do silêncio, que tem o poder de matá-las...
     Acredito que minha alma falou por mim. Só lhes acrescento e justifico a razão de minha não aceitação da impotência perante as forças do irreversível...
     

      Houve um acidente de trânsito no Estado de Santa Catarina, a serviço da empresa multinacional em que ela estagiava. 
     Seu colega que dirigia o veículo, e outra funcionária que seguia no banco traseiro, foram ambos para a U T I de um hospital do município e se salvaram. 
     Ela faleceu no local.
                                                  
                                                


< IN MEMORIAM >
Fique em paz eterna amada.
Ocultarei em meu coração seu nome.
Que os Anjos lhe transfiram toda a saudade,
O amor e o carinho que lhe dedicarei 
em vida e pela eternidade.




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“Não criei personagens. Tudo o que escrevo é autobiográfico. Porém, não expresso minhas emoções diretamente, mas por meio de fábulas e símbolos. Nunca fiz confissões. Mas cada página que escrevi teve origem em minha emoção” 

(Jorge Luís Borges).