domingo, 19 de março de 2017

O SILÊNCIO ERA MAIS PIEDOSO...

























O silêncio era mais piedoso...
M. Martins Santos


Nem tudo precisa ser dito; nem tudo que se diz tem volta. 
Muitas coisas se dizem - que não deviam ser ditas;
muitas outras se calam - que não mereciam calar-se. 
As palavras são as mesmas, em um e outro caso;
só a conveniência delas, na circunstância, é que varia. 
(...)
[Carlos Drummond de Andrade, no livro Os dias lindos]



Nem sempre me calava por não ter o que dizer-lhe.
A maioria das vezes preferia o silêncio mais piedoso,
do que ouvir tudo o que não foi o que pensei ao lhe falar.
Não que só desejasse ouvir o que queria; mas um vislumbre
de tua alma com isenção do peso do aparente desprezo.
Meu amor por você assustava a mim próprio tal a dimensão
que foi tomando desde seus dezessete e meus vinte anos,
se conformando ao longo do tempo  em alma e coração...
Com as portas da sede do meu amor sempre abertas,
o instinto que acompanha o eu animal, percebia
uma blindagem na sua alma.
Como se fosse um revestimento interno de folha de chumbo,
com uma válvula controlável de entrada e nenhuma de saída.
Não sei a origem nem o tamanho de sua culpa, mas esse mecanismo letal, ao tempo paralisa o pulsar do amor no coração.
Um coração agonizante volta-se para a sua salvação.
Quando reiteradas vezes em quase súplica, pedia-lhe não ironias,
os risos sarcásticos, que abrisse o coração, não jogar com acintoso movimento de cabeça os cabelos para trás...
Que acreditasse no tanto que a amava: recebia seu conhecido riso de ironia... Pena, pois sua boca e lábios eram lindos.
Vencido pela exaustão das tentativas de abrir-lhe o coração, disse-lhe um dia: “Se tudo acabar entre nós, será para o resto da vida”... Ela respondeu-me secamente: “Para o resto da vida...” Nada mais que isso...
Após esse dia morre aquele Ser, e surge outro que escreveu este poema:


























O TANTO QUE TE AMEI

Lá no século que se foi,
Fui jovem e muito amei.
Mas tanto, tanto a amei
Que sei que mais fui eu.
Hoje no século seguinte,
Velho um século a mais
Deus meu, como queria
Que não tivesse sido eu!

[m.m.s]




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