terça-feira, 27 de janeiro de 2015

SÓ...
















SÓ...

Pelas discórdias todas desta vida
Venho trazendo inteira esta dor;
Já minha esperança a tenho perdida
Aos poucos morre em mim o sonhador.

A felicidade busquei e não a senti,
Sonhei ser um escritor, que ilusão...
Amor, amor... quimera que logo perdi
Foi tudo se perdendo, ficou a solidão.

Nas noites a minha insônia aborrece,
Fraqueja o Velho Soldado guerreiro,
Ai, de quem gosta de prosa e poesia
Hoje, só meu gato é fiel companheiro.

Lugares de encanto por onde eu andei,
Sonhos embalados de uma alegre jornada,
Levo comigo alguma tralha do que amei...
Sinto o desamor, tão só nas madrugadas.

Nos lugares bisonhos de estranho cantar,
Assusta-me não o gélido vento da morte,
É uma alma ao meu lado não se importar,
E por capricho deixar-me à própria sorte!



CARTA DE UM DIABO AO ADMINISTRADOR DE UMA ALDEIA


CARTA DE UM DIABO AO ADMINISTRADOR DE UMA ALDEIA

"O melhor método para expulsar um demônio, se ele não ceder aos textos das Escrituras, é ridicularizá-lo, zombar dele, pois ele não suporta o escárnio"
(Lutero)

"O diabo (...) o espírito orgulhoso (...) não
tolera ser motivo
de chacota"



       Esses casos assim denominados insólitos, às vezes bizarrosanormais ou fora do cotidiano, dependendo de quem os vê ou do ângulo visto, pode acontecer em qualquer época ou lugar no mundo.
       Ainda, depende do grau de conhecimento das suas defesas psíquicas, seu próprio psiquismo, e, sobretudo conhecimento do sobrenatural acomodado na esfera do Bem. Pois, isso vai depender da quantidade de Bem ou de Mal contido na pessoa que vai descrever, contar ou recontar sua vivência extraordinária.
      
       "Não tenciono explicar aqui como caiu em minhas mãos a correspondência que ora ofereço aos leitores.
       Há dois erros semelhantes mas opostos que os seres humanos podem cometer quanto aos demônios. Um é não acreditar em sua existência. Outro é acreditar que eles existem e sentir um interesse excessivo e pouco saudável por eles. Os próprios demônio ficam igualmente satisfeitos com ambos os erros, e saúdam o materialista e o mago com a mesma alegria" ( C.S. Lewis)

      
        
  Um diabo em desânimo, antes de voltar ao inferno, deixou ao chefe administrativo de uma aldeia a seguinte carta:
       -Um dia, (pois ninguém sabe quando chego e quando saio) cheguei a este lugar que vocês chamam "Val Felice", cujos habitantes nobre dirigente, irritantemente, fazem realmente jus ao nome de sua aldeia, pois vivem em amor, paz e usufruindo de Virtudes.
       Afirmo, Excelência, que usando de todas as minhas diabruras até as mais eficazes com que comando a maior parte do mundo, tentações e tentativas de discórdia (uma de minhas armas mais eficazes) fui incapaz de endemoninhar um habitante sequer de seus concidadãos, que tem o terrível mau gosto e hábito, de usarem um emblema de um peixe, ou uma cruz no pescoço ("com mil infernos!). Fazerem constantes orações ao meu inimigo, que me arrepiam de nojo e pavor; e, mais ainda, cantam músicas que falam de seu abominável mestre, que por mais que me esforce não consigo me aproximar deles.
       Senhor administrador e chefe religioso de "Val Felice" de ti também não consegui me aproximar, pois uma força me empurrava ao contrário. Mas, ao preparar-me para escafeder o mais breve daqui eis que surge  uma linda e jovem mulher de corpo fenomenal, além de bela, sensual e provocante - como os diabos gostam -  saída não sei de onde, do meio de um a labareda, e me afrontava com vanglórias e sarcasmos, dizendo-me que fui fraco e ela provaria ser mais eficiente que eu, desafiando-me que venceria nos locais em que fui derrotado, de goleada.
       Claro que duvidei Excelência! Mas ela sorriu sarcástica dizendo:
       - Vai embora capeta covardão, saia derrotado e humilhado, com esse rabão comprido metido entre as pernas, para que o povo de "Val Felice" morram de rir lá na igreja; que é o lugar onde mais se abastecem contra ti. E deu uma estridente e divertida gargalhada na minha cara Excelência! Na cara do demônio que sou!
      
        O diabo assim humilhado, por tão vil desafio, e proferido por uma mulher, amarraram ali mesmo uma aposta.
        Ela propôs ao capeta, visitar a casa de um casal, modelo de amor e felicidade. Aproveitaria a ausência do marido representante de uma multinacional, que às vezes pousava na localidade em que fora visitar.
       Fez-se amiga da jovem esposa. Depois de ganhar a confiança da mulher, foi logo dizendo: - Gertrudes, os homens, dos quais eu conheço o mapa de cor e salteado, eu sempre soube, mas de dias para cá tenho a certeza, eles são todos uns trastes! Quer uma prova? Saiu toda rebolativa com seu corpo escultural, seu decote mais do que generoso, seus cabelos negros longos lisos e brilhantes, lábios vermelhos e saltos altos, vestido justo vermelho brilhante. Deu um pequeno passeio na rua de Gertrudes. Um homem entrou com a bicicleta em um buraco e caiu. Outro trombou com um poste. Ainda outro, ficou com a correia e a coleira na mão, sem o cachorro que fugiu! Todos e mais alguns, por terem ficado hipnotizados com a presença daquela mulher.
      
        Ela volta e fala para Gertrudes: - Não falei para você minha querida! Os homens são todos uns trastes, uns cachorros sem-vergonhas, não merecem o dedicado amor de nós mulheres! Para onde vão, amam e dormem com outras!
       -Olhe! Eu nada tenho a ver com o que você pensa... Apenas - você viu a prova - esta é a verdade, minha pobre e querida Gerthy. E saiba minha querida amiga, que o seu Rui não é diferente desses honrados homens que quase "se mataram" para me olhar, não! E veja que eles não ficam um domingo sem frequentar a igreja.
       -Gerthy querida, você sabe por acaso onde está o Rui agora e o que ele está fazendo?  Não, né!? Já sabia...
       Mas escute bem esta amiga aqui. Tem uma coisa "simplérrima" que você pode fazer; o seguinte:
      
 - Quando o Rui voltar para casa, na hora de dormir, você lhe nega fazer amor por estar com muita dor de cabeça, e se ele for te beijar você diz que está com muito sono. Quando ver que ele já está dormindo, você... Gerthy, pega uma faca bem afiada e corta dois ou três fios da barba e do cabelo do Rui. Certo, Gertrudes querida!? – Uma faca. Tesoura não vale.

Por que isso?? Porque você vai me passar esses fios de barba e com eles eu farei uma simpatia infalível que aprendi com minha tia Zuleica. Ela fez e não falhou. Para todas que eu fiz a poção, nunca mais nenhum marido olhou para outra mulher. Com você vai ser a mesma coisa. O Rui vai pegar ojeriza por outra que não seja você. Vai ver!

       Gertrudes, que a mulher fatal já intimamente chamava de Gerthy, fez a estapafúrdia promessa à intrusa, e, acreditou piamente nela.
       Fato contínuo, a sagaz mulher intercepta Rui antes de chegar
em casa. Fala que ele tenha calma e se controle, que infelizmente toda a aldeia sabe que sua esposa o está traindo com o estancieiro; que era seu amante e que ambos haviam tramado matá-lo enquanto dormisse. Que, a encarregada de assassiná-lo era sua própria mulher com uma faca muito afiada, de matar porcos lá da estância. Com todos esses detalhes, Rui ficou ansioso de que a história daquela mulher fosse mentira, visto o imenso amor que tinha pela esposa.
      
       O melhor truque que encontrou foi fingir que estava dormindo; com os sentidos aguçados, com "um olho aberto e outro fechado".
       Então, que desgraça! Viu Gertrudes vindo com a faca muito afiada. Saltou para fora da cama num "pulo de gato" o mais longe que pode da faca. Num repente, de lá, saltou sobre ela esfaqueando-a mortalmente no peito, com uma outra faca que havia deixado debaixo do travesseiro. Gertrudes caiu sobre uma poça de sangue.
      
       Cumpriu a certeza de sua defesa, com sabor de vingança: - Pensou Rui.
       A notícia espalhou-se na aldeia como fogo na palha: irmãos, primos, os pais, tios, amigos... Todos correram ao local onde flagraram Rui em estado de choque, sem conseguir se mover.
        Não houve conversa, pergunta nem argumentos, Rui foi linchado, trucidado, pela família numerosa de Gertrudes. Por vingança, ódio e furor insano, perante o cenário horripilante.
       O ódio se apossou daquelas pessoas, que até antes eram pacíficos e ordeiros, cumpridores das leis e seus deveres. Retiraram o corpo de Gertrudes do quarto e o levaram. Em seguida atearam fogo na casa com o corpo de Rui semivivo lá dentro e todos em massa, urrando e proferindo palavrões indizíveis foram à cata dos demais parentes de Rui: dizimando, velhos e crianças desde que fossem aparentados, queimando as casas e matando os animais. Nem cachorro ficou vivo.
      
      Com isto deflagrou-se uma guerra entre famílias, Foram computados, antes que a guerra familiar chegasse ao fim, mais de 18 crianças de todas as idades, até as que mamavam, 115 mulheres, entre meninas, adolescentes, moças e velhas  135 homens de todas as idades, não importando o grau de parentesco, desde que fossem da família  de Rui Stephanus, ou seus agregados. Somando-se os da família de Gertrudes com menos baixas.

      O diabo ficou pasmo de surpresa, seus pelos se eriçaram horrorizado com a eficiência daquela mulher, que não só fez a desarmonia entre o casal, como os fez se matarem e causar uma terrível guerra entre famílias, que sabe lá quando ia terminar.
      
      Deixou o seguinte final em sua carta ao administrador da Aldeia: Vocês nunca mais me verão por aqui! Perdi a aposta para uma mulher...! Ela com certeza pode mais que uma legião de demônios!! Até nunca mais “Val Felice.”
   

    - Fui! - Concluiu o diabo. 

PROSA PARA PENSAR NO ADEUS...


PROSA PARA PENSAR NO ADEUS...

Lembremo-nos que por vezes, necessitamos de dizer, ainda que por metáforas e parábolas - assim sem se constranger - o que nos é retido na alma. O intransigível existe e contrapõe-se ao nosso campo de emoções positivas, por vezes superáveis, outras nos levam junto ao objeto do amor que se foi.

As pessoas que mais amamos - às vezes achamos - que são as que mais nos decepcionam nos causam espanto ou surpreendem; por julgarmos que são, ou deveriam ser perfeitas e esquecemo-nos fragorosamente que são humanas.
E nisso somos inquietos, imediatistas, egocêntricos e incompreensíveis, na maioria das vezes. Em estudo de causas, se verifica que os desenlaces afetivos recaem sobre esse fato, de partirmos do princípio que (nós) somos produtos acabados, protótipos aos demais semelhantes e que (os outros) nos façam felizes, quando quisermos e não quando eles estiverem também, sido feitos felizes. É isto que escapa aos relacionamentos afetivos e os dentes da engrenagem emocional não se encaixam.
Porém a vida é paradoxal, como fosse experimental. E calculo que realmente seja. Nesse entendimento é a inquietação do amor que dá ao universo o movimento eterno; é a vertigem do amor que faz girar os mundos.
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Se pudéssemos... Ah, se pudéssemos retroagir todas as voltas da espiral do tempo e reencontrar aquele grande amor, isento de culpas, como um dia fôramos os dois... E reiniciarmos a contar as estrelas do ponto onde paramos... No silêncio da noite, a neblina nos evolvendo, a lua viajando serena entre nuvens rendilhadas, no céu polvilhado de pó de prata. Tu buscando abrigo e calor nos meus braços. Estava tão fria a noite... E ao longe alguém talvez amando como nós, ou sofrendo a ausência de seu amor ao som de um violino cantava – no silêncio absoluto da noite – esta canção:


Queima no deserto o inclemente Sol,
Iluminando mais um dos dias esvaídos
Entre dunas e planuras intermináveis...
Minha alma queima a última chama
Para chorar-te sob um céu de estrelas.

Solidão! Meu horizonte é o vasto mundo,
A Levar consigo meus sonhos e deixas,
Flano asas em busca de tua imagem
Viva, sobre a aridez deste meu corpo.
Teu perfume, flagrante lembrança reserva,
E do cansado lamento eu faço segredo.
Tu serás meu refrigério, meu encanto,
Meu celestial poema no tórrido deserto.
Meu oásis; rainha de soberana calma,
Sombra de tamareiras, para a minh’Alma!

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   Ah! Se pudéssemos retornar à grande árvore encantada, coração do jardim de nossos sonhos, descontaminados de todos os pecados que aderiram aos nossos corpos e afetaram nossas almas; modificaram nossas vidas, nossos caminhos, nossos ideais. Ah! Se pudéssemos voltar...
     Estarmos tão puros como ao tempo em que conversávamos em silêncio, por olhares. As batidas do coração comandavam nosso desejo e a emoção. À aproximação de nossos rostos, os corações aceleravam-se, antecipando o beijo e as carícias; intensificava-se teu inconfundível aroma. Teu rosto se aquecia, tua respiração se entrecortava seu hálito era perfumado e quente. Ingressava-me em outro mundo paralelo, do qual não queria mais voltar, queria que se transformasse em um labirinto do qual jamais acharia o retorno. Ali construiriamos nosso mundo, um universo de sonhos. Apossava- me um encanto místico, um sentimento de todo não revelado. E eu indagava solenemente a ti:


    - És às vezes indecifrável, enigmática... Isto me faz teu curioso prisioneiro, refém da busca, da procura de teu interior. Teu exterior, Tua beleza, me seduzem profundamente. Mas que pensas de mim? O quanto pensas em mim e por onde andas e o que fazes quando estás sem mim? O que almejas da vida seria o mesmo que eu? Por que buscavas a mim no começo de tudo, com tanta insistência amor e sofreguidão?

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     O notável era minha total abstração do desejo de posse de sua liberdade ou o tão desgastado significado [para mim] deste sentimento menor: o ciúme. Meus pensamentos transitavam em outras esferas, embora ainda fossem lá misteriosos os caminhos para mim.

     Porém, a cada encontro toda a mágica se refazia. E eu temia pela sua ausência física. Mas nunca lhe falava desses meus pensamentos. E procurava sempre os assuntos mais alegres, leves e condizentes com a felicidade daquele encontro. Nunca existiu um único desentendimento ao longo de nosso relacionamento.

     O tempo que passava contigo, seria o mesmo tempo cronológico do mundo? Passavam-se horas cronológicas e a teu lado apenas mero segundo. Sentia em minha alma uma sensação de vazio, quando só. Misto de dúvida, afeto e amor. Mas de incompletude. Minha alma estava começando a ficar desolada em separado, necessitava de sua alma junto a mim. E eu próprio me recolhendo da vida lá fora.

     Relutava contra um poderoso e avassalador sentimento, que  seria um sofrimento prolongado, amor excessivo fora das raias da razão. Sabia ainda, que seria uma desmedida paixão que recairia em um possível desgosto, e desalento profundo.

  Enquanto diagnosticava esses sinais em mim, não percebia “clinicamente” os mesmos sinais nela. Pensei no que a lógica da psicologia afirma: "As pessoas são diferentes..." Sim. Por isso este relato! Caso não o soubesse não teria meios para        essas análises paralelas. Descobrira que as pessoas não só são diferentes, como pior nem sempre congruentes nos finais de sonhos em comum.

     Era ainda esse desconforto, é claro, apenas uma sensação. Mas incômoda. Como nos sonhos, o tempo ao lado dela se desenrolava revelando todo o enredo de nossas vidas. Passado, presente e futuro, pareciam sair da abstração e se materializar em um só fenômeno que não parecia estar caminhando para a ¹Eucatástrofe.
   
    Muitas vezes abraçados, tinha dentro de mim um sentimento enorme de ternura, quando ela repentinamente tinha um suspiro curto e sentido. Essa reação que remete ao campo das emoções, sempre me foi de difícil compreensão. Talvez por ser uma das coisas que nunca ousamos emitir perguntas sobre a razão. Apenas elas existem e até emolduram uma noite de céu muito estrelado, envolta no intenso perfume de “damas-da-noite”.

     Este cenário, sempre ao atentarmos bem, ele fica místico.
Ela para mim, deixavas de ser real e comigo entrava em outra dimensão. O nosso amor, envolvia-nos em um turbilhão e nos levava a estágios e pousos de encanto e beleza. Éramos, tomados de uma profunda paz, difícil de descrevê-la. Mas nunca a via sorrindo amplamente, sempre um sorriso esboçado e contido. Não era tristeza, mas era algo que... não oferecia resposta satisfatória para meu íntimo.

     Os pensamentos, que me vinham queimando em chamas, eram por ela rebatidos com afagos suaves, carinhos e meiguice leve. Ficávamos sem palavras, no silêncio - ajeitava-lhe os longos cabelos, alisando-os com as mãos, percorrendo levemente com os dedos os traços lindos de seu rosto, sua boca, seus lábios, contornando-os como se estivesse desenhando uma obra de arte.

     Sua beleza irradiava-se com extrema naturalidade, de cabelos negros bem longos, corte reto; olhos castanhos, magra, não tão alta a ponto de não poder usar saltos “quinze”.
Sem nenhuma das características que marcam as grandes belezas feitas pela mídia (as louras, as ruivas de olhos azuis etc.). Mas ela era, com o conjunto desses traços, de uma forma tão bem distribuída que a faziam a jovem, a mulher, mais linda que já conheci.

Seus olhos castanhos eram profundos, pareciam ler meu interior, suas sobrancelhas eram usadas praticamente ao natural, sua boca de dentes perfeitos tinha os lábios perfeitamente delineados, e sempre com batom cor- de- carne, com pouco brilho ou opaco. Seus únicos adereços: um anel, uma pulseira de corrente dourada, e um inseparável medalhão preso a uma corrente longa de ouro dourada.

     Ao ser afagado, recebendo seus meigos carinhos, no íntimo eu cismava como se existisse algo acontecendo ou uma barreira invisível em nosso relacionamento. Procurei não pensar mais nisso. Só que, minha imaginação foi se transmudando de abstração para realidade ao correr do tempo. Aqueles carinhos e meigos afagos foram diminuindo de intensidade emotiva. Sentia que não havia “alma” nos abraços, nos beijos. Sentia haver ainda que levemente, um quase imperceptível afastamento. (Só percebido pelos exercícios de meu pensamento).

Não mais suportando as dúvidas e o grande incômodo que vinha sentindo e os pensamentos que de todos os tipos me assolavam a mente, eu pergunto-lhe se estaria algo afetando os sentimentos em relação a nós... Ela possuía várias características que eu bem conhecia: sinceridade era uma delas; era verdadeira; fiel; sincera; orgulhosa e altiva quando precisava ser. Sabia que me amava de forma extrema quando começamos o namoro. [E pensar que eu antes a ignorava.]
Era educada e gentil para comigo, sempre. Mesmo sem respostas; aprendemos a decifrar silêncios. Conclui minha pergunta suscintamente: - Por quê?

- Porque é preciso! - Responde ela com surpreendente serenidade.

- Explique-se, por favor! Seja mais conclusiva. – disse-lhe.



 Respondeu-me: - Porque precisamos contar mais estrelas, assistir mais pores- de - sol, nos vermos em meio a mais neblinas de rigorosos invernos, caminharmos sob a chuva fria, dividirmos as mudanças das estações da vida, para podermos compor nosso poema ideal...
     
  Falava como se estivesse perscrutando a própria alma. Seu olhar era distante, em um horizonte há anos luz de onde estávamos. Como se em seu coração houvessem instalado uma tábula com uma inscrição profética. Era uma sacerdotisa apocalíptica, estava a anunciar vários fins: o meu, o dela, de nossos sonhos mais alentados, a existência de um amor sem precedentes, sem medidas. Eu ia além do amor, a venerava.

    Mas estava a dizer-me adeus? Foi isso que entendera! Ela me amava era certo, mas não podia dizer que ela era daquelas criaturas que poetizam tudo ou filosofam a todo o momento. Era bastante parcimoniosa com seus sentimentos pessoais. Demonstrava fortemente suas emoções por atos e atitudes.

     Essas palavras, não eram de forma corrente usuais dela. Embora fosse muito inteligente. Talvez usasse menos palavras, por sua área escolhida ter sido das exatas que a faziam mais racional, ou por ela ser assim, ter escolhido iniciar-se nesse campo das ciências. Enquanto eu fui para o magistério ela foi para a contabilidade, a seguir ciências contábeis.
   
        
  
  Choramos. Ela chorou muito! Soluçava convulsivamente. Mais explicações não tiveram...
A inteligência e a racionalidade não foram feitas só para constar dos verbetes, foram descobertas para direcionar as pessoas. Temos que saber como agir e se portar diante do inevitável.

Fatidicamente foi um inacreditável adeus! Amigos em comum ficaram abismados, sem acreditar que isso tivesse acontecido...

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 Porém para dois corações apaixonados, não nos esqueçamos de que é da vida cruzar desertos. A busca sempre será a de um oásis onde predomine a verde esperança do poço de águas cristalinas. O perigo é a armadilha da enganosa miragem.

Procuramos na aventura da vida, a boa ventura da fonte encontrar, para que dela bebamos e sejamos abençoados.
Mas os desígnios do amor nem sempre exige de uma das partes o risco de lançar-se ao desconhecido caminho sem olhar para trás. Nem sempre um dos que se amam - se propõe a acreditar - que se lançando por amor às chamas, ao sumidouro do mar, ao abismo- sem- fundo, possa à vida retornar.

     Foi no primeiro obstáculo, o do deserto, que ela titubeou. Claro que achei normal, tão jovem e frágil em não confiar que eu, apesar de amá-la acima de todas as coisas do mundo, pudesse vir a provê-la de um manancial em pleno deserto!
Não conseguiria jamais fazê-la ser a mesma outra vez. Tinha a certeza!
     Como escrevi depois:
 
- Tornastes uma estrela que se apagou dentro de mim - só tua luz resta a percorrer o universo de minha alma. Não se reconstrói uma estrela jamais. Só a sua luz permanece para toda a eternidade! Por isso fico com tua luz, tua lembrança. Adeus!


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     Somente por amor e tão somente, é que nos lançamos aos percalços da vida, com a alma em pedaços, mas sem olhar para trás. Só a soma de dois grandes amores constrói uma paixão, que nos faz morrer por muito amar! Mas aí a vida se refaz e a morte passa a não existir: ser um engodo, uma mentira, frente àquela única verdade o indiscutível e verdadeiro Amor! Morre a estrela fica a sua luz, ali presente a viajar na imensidão do Universo eternamente. Ela não existe mais. Morreu há séculos, milhões de anos, mas ela está presente sempre vista por nossos olhos, sentida por nossa alma, refletindo seu brilho em nosso coração.

     Cerca de quatro anos se passaram depois daquela resposta às minhas perguntas - quando naquela ocasião ela respondeu:  “Por que é preciso!”  [...] “Contarmos mais estrelas... Vermos mais neblinas de rigorosos invernos”...

 
     Nada mais tenho a lhes relatar... Sinto-me vazio de ânimo, espírito e palavras...

     Palavras... Palavras... Palavras. Como frente ao irretornável soam sem sentido! Como são destituídas de espírito, fracas, sem importância ou significado... É quando compreendemos a força do silêncio que tem o poder de matá-las... Talvez tenha sido  isso  que  Shakeaspeare pensou ao pronunciar: Words...Words...Words.

     Acredito que minha alma falou por mim.
    Só lhes acrescento e justifico a razão de minha inaceitação da impotência, perante as forças do inevitável...

 Houve um acidente de trânsito no Estado de Santa Catarina, a serviço da empresa multinacional em que ela estagiava. Seu colega que dirigia o veículo, e outra funcionária que seguia no banco traseiro, foram ambos para a UTI de um hospital do município e se salvaram.

Ela faleceu no local.



< IN MEMORIAM >
Fique em paz eterna amada.
Ocultarei em meu coração seu nome.
Que os Anjos lhe transfiram minha saudade,
O amor, todo meu carinho, pelo resto
da vida e a eternidade.
<> 

“Não criei personagens. Tudo o que escrevo é autobiográfico. Porém, não expresso minhas emoções diretamente, mas por meio de fábulas e símbolos. Nunca fiz confissões. Mas cada página que escrevi teve origem em minha emoção” (Jorge Luís Borges).

<> 

1.Eucatástrofe – Um ponto onde se chega a pensar que está tudo perdido e, de forma inesperada, todas as adversidades são diluídas e superadas [Palavra cunhada por J.R.R. Tolkien]




domingo, 18 de janeiro de 2015

JE SUIS CHARLIE - UMA ANÁLISE SOBRE "TRAITÉ SUR LA TOLERANCE" - VOLTAIRE


JE SUIS CHARLIE - ORAÇÃO DE VOLTAIRE - TRAITÉ SUR LA TOLERANCE


Recebi uma mensagem de meu irmão mais novo. Ele escreve:
“Gostaria de pedir - visto que todos os povos, cada um a seu jeito, acreditam em um Deus, - que parassem um minuto o que se estão fazendo e atentassem ao que está acontecendo: O mundo está perigosamente caminhando para a intolerância” (...)

Entre outras considerações, mais confidenciais; aderi à esteira de seu pensamento; mas em termo de exposição, isenta de confrontação com os acontecimentos que assolam o mundo sob o capuz de vários dogmas, matizes bandeiras e uniformes camuflados, que disparam aleatoriamente suas metralhadoras e fuzis, sob lemas difusos ou claramente radicais.

Ele me fez a pergunta direta : - Não sei se você já leu Voltaire "Traité sur la Tolérance"; principalmente no capítulo XXIII "Prière à Dieu"?
- Sim já li, primeiro obrigatoriamente nas aulas de Littérature Française, depois por puro interesse...

Embora o que mais chame a atenção no momento são os fatos do jornal e revista Charlie Ebdo, na Franca, resultante no mundial “Je suis Charlie” não estou pisando no tapete vermelho dos fatos elegidos, nem escolhendo as cores do manto que reveste a Terra neste emblemático momento do "Je suis Charlie"; apenas, - como meu mano diz - peço que reflitam...

Voltemos ao ano 1762, recordemos as barbáries cometidas, leiamos a prece de Voltaire muito atentamente e depois formemos um juízo com base e crédito no que foi dito. Lembrando-nos que Voltaire, foi um contestador do estado de coisas: teológicas, sociais e políticas de seu tempo, para cuja coragem, ainda não nos detemos o suficiente para avaliar. Visto que, o suplício na roda de tortura, a fogueira, a decapitação, a forca eram usadas no ato da prisão. Julgamentos além de forjados eram um luxo e uma cortina de fumaça para as posteriores execuções. E esse ritual era aplicado às coisas de somenos importância: furto de uma maçã, um pão, desejo pela mulher casada com alguém, imputações falsas de heresia, conversão à outra seita contrária, banalidades e barbaridades absurdas, às claras e às escondidas.

Carecia e de muita coragem, para estar sempre às portas de uma armadilha forjada e tramada atrás dos muros dos castelos e paredes dos palácios e da Igreja. Os Intolerantes mudam apenas nomes e vestes no tabuleiro da História.


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Um entrevistado no palco dos fatos, na Rua do Charlie Ebdo, moderno compatriota de Voltaire, com o cenário de fundo de milhares de pessoas em protesto, com velas, lápis e canetas nas mãos e os cartazes negros “Je suis Charlie”, ele diz: “A cultura francesa desaparecerá, a França não é e não será a mesma; como vemos, o seu próprio lema a destruirá. O que restará depois disto?” – palavras de um cidadão francês.
Na mesma reportagem entrevistaram uma brasileira residente há mais de 20 anos em Paris, que mora a uma quadra do Charlie Ebdo, palco do ataque terrorista, que disse: “Eu vi tudo de minha janela, como todo brasileiro sou curiosa, não pensei no perigo, queria ver o que estava acontecendo... em seguida, a outra pergunta da repórter, diz: Acho que daqui a uns dias, três ou mais, talvez uns quinze, tudo estará acabado, esquecido e tudo voltará ao normal.“ – Palavras de uma cidadã brasileira... Quem ou qual visão social, cultural e de politização está mais coerente e conexa com a grave e imensa complexidade de convivência social deste planeta mundanizado? Que distanciamento quilométrico de entendimento histórico-cultural, separam estas duas pessoas? Isso pode parecer nada, mas é um fator complicador no entendimento global e no andar da História entre as raças, (eles não são únicos, um só indivíduo, são milhões que pensam assim como a entrevistada) quando as emigrações, como foi para a França e a Inglaterra se voltarem, por exemplo, para o Brasil, temos noção da extensão das dificuldades de acomodação e convivência?


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No fim, quando "a discórdia é o grande mal do gênero humano e a tolerância o seu único remédio", quando este realismo pode mesmo assim ser animado pelo desejo utópico da fraternidade, Voltaire faz da tolerância um projeto universal.
Diz então que "não é preciso grande arte, eloquência muito rebuscada, para provar que ‘diferentes cristãos’ devem tolerar-se uns aos outros”. Que se dirá de outras visões transcendentais, místicas, ritualísticas e religiosas. “Mas vou mais longe: digo-vos que é preciso olhar para todos os homens como irmãos”.

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Aqui abro um adendo na linha semântica textual para perguntar: - Mas Cristo já não disse isso reiteradas vezes para aquele povo? E a oração de exortação: “O lamento sobre Jerusalém”, feita por Jesus [Mateus 23: 37] e demais todas as suas orações, incluindo o Pai Nosso?

Outros assombros e perguntas: - O quê!? Um turco, meu irmão? Um paquistanês? Um norte-coreano? Aquele chinês, meu irmão? O judeu? O ucraniano-russo? E que acham de um norte-americano aceitar tudo isso? Desde Lincoln a Martin Luther King : “Eu tenho um sonho”; os negros e brancos norte-americanos não acordaram ainda. E milhares de milhares de pessoas, de peles de todos os matizes nunca mais acordarão desse sonho.

A tolerância, que nunca soou com significado tão utópico; deve e precisa ser; inalienável para a vida e que seja o apanágio da humanidade; crendo ou não nos Profetas das Escrituras Cristãs e no que João disse em seu derradeiro livro bíblico.

Caso contrário crendo em um Deus ou não, tenha o nome que os povos derem; não vai interessar nada mais. A intolerância e o radicalismo, a quem nem filho, mulher, desconhecidos inocentes, crianças, pouco lhes importam... Nem sua própria vida que a tratam menos que nada... Que se há de esperar?

Em 1762, Voltaire faz observações, medita, racionaliza e ora pelo massacre de 4.000 huguenotes – MOTIVO? INTOLERÂNCIA. E o genocídio ocorreu entre cristãos.
O tempo para o ocidental é um; quando em lazer e conforto, férias com dinheiro, é até muito breve. Para o oriental fundamentalista e radical das terras áridas, o tempo é outro, é de séculos. Calor, deserto, tempestades de areia, fome, sede, morte; para eles nada dizem os milênios tampouco. Uma vida que significa? Não lhes saiu ainda da cabeça as Guerras Santas... Vamos parar e pensar...

Voltaire, este pensador que Victor Hugo dizia ser um “jato contínuo de lucidez”, não economiza nos elogios que faz ao bom senso que a filosofia traz, possibilitando-nos transcender as estreitezas em que nos encerram os fanatismos dogmáticos e as intolerâncias homicidas.
“A filosofia desarmou mãos que a superstição por muito tempo havia ensanguentado; e o espírito humano, ao despertar de sua embriaguez, espantou-se com os excessos a que o fanatismo o havia levado…” (pg. 24)

Ao que parece, ao raiar deste ano que chamamos de 2015 depois de Cristo, o “espírito humano” não cessa de recair na embriaguez do fanatismo e da intolerância – quantos continuam sendo os mortos em Faixa de Gaza, quantos no Afeganistão, Cisjordânia, na Palestina, Síria e no Iraque? Alguém por aí conseguiu não perder a conta? E os atuais ataques terroristas, amplamente divulgados?...

Enquanto isso, Voltaire com a sua filosofia, não cessava de se espantar com os excessos do fanatismo – com aquela filosofia que se esquiva do dogmatismo e procura atingir a liberdade do pensar ao invés de ser mera “defesa manhosa de preconceitos batizados de verdades.”

Voltaire é entusiasmante de ler, pois filosofa de maneira espontânea tendo a força transformadora que não se impõe, se aceita por pura assimilação de algo que nos é explicitado da gravidade descuidada para o consequencial.

Voltaire escreve seu Tratado Sobre a Tolerância sob o impacto de um acontecimento que ele testemunhou em Toulouse. Nesta cidade francesa, pelos idos de 1762, continua-se a celebrar anualmente uma festa que Voltaire considera execrável: “festa cruel, festa que deveria ser abolida para sempre, na qual um povo inteiro agradece a Deus em procissão e felicita-se por ter massacrado, há duzentos anos, quatro mil de seus concidadãos” (pg. 62).

Duzentos anos antes, em 1562, os reis católicos franceses e as massas por eles manobradas haviam massacrado os protestantes pela França afora. A História jamais pôde esquecer a sanguinolência do Massacre da Noite de São Bartolomeu, “da qual não havia nenhum exemplo nos anais do crime” (pg. 22), quando Paris foi palco de uma colossal matança dos protestantes “huguenotes” – como narrado por Alexandre Dumas em A Rainha Margot (romance já adaptado para o cinema com maestria por Patrice Chéreau). Aponta-se que o número total de pessoas mortas pelos católicos no genocídio dos huguenotes de 1562 esteja entre 30 e 100 mil mortos.

Introduction à la "Prière à Dieu" – Voltaire

Prière à Dieu: Traité sur la tolérance de Voltaire, «se il vous plaît Dieu»
N'a pas besoin de beaucoup de mots pour votre présentation. Sa prière qui parle de tolérance et de ses nombreux aspects est un résumé de sa propre pensée. Ce est le rôle de la prière, de laisser les émotions particulières utilisent la raison, le résultat de la méditation longtemps étudié, en pleine maturité. Le courage de la confrontation, de la justice, de la douleur humaine ne est pas contenue derrière et sous les robes et les positions. Les cris jetés dans l'air, sont encore historiquement les plus faibles, les plus humbles et les plus défavorisés. La différence dans le monde d'aujourd'hui est l'oppresseur sans visage. Peu importe la classe sociale des victimes et des morts. Tout est aléatoire et terrible. Les enfants, les personnes âgées, les malades des hôpitaux, des étrangers; ne importe qui peut perdre sa vie pour aucune raison et sans savoir pourquoi et d'où il vient sa mort.
(M.M.S.)

Introdução à "Prece a Deus" - Voltaire - [Versão]

Oração a Deus: Tratado sobre a tolerância de Voltaire. "Agradar a Deus"
Não precisam  muitas palavras para a sua apresentação. Sua oração, que fala de tolerância e de seus muitos aspectos é um resumo de seu próprio pensamento. É o papel da oração. Deixe as emoções particulares use a razão, o fruto da meditação longa estudada, plenamente amadurecida . A coragem do enfrentamento, a justiça, a dor humana não está contido por trás e sob vestes e posições. Os gritos lançados no ar, ainda são historicamente dos mais fracos, mais humildes e desfavorecidos. A diferença no mundo de hoje é o opressor sem rosto. Não importa a classe social das vítimas e dos mortos. Tudo é aleatório e terrível. Crianças, idosos, pacientes de hospitais, pessoas estranhas; qualquer pessoa pode perder a sua vida sem razão e sem saber o porquê e de onde vem a sua morte.


PRIÈ À DIEU - VOLTAIRE

Ce n’est donc plus aux hommes que je m’adresse ; c’est à toi, Dieu de tous les êtres, de tous les mondes et de tous les temps : s’il est permis à de faibles créatures perdues dans l’immensité, et imperceptibles au reste de l’univers, d’oser te demander quelque chose, à toi qui a tout donné, à toi dont les décrets sont immuables comme éternels, daigne regarder en pitié les erreurs attachées à notre nature ; que ces erreurs ne fassent point nos calamités. Tu ne nous as point donné un cœur pour nous haïr, et des mains pour nous égorger ; fais que nous nous aidions mutuellement à supporter le fardeau d’une vie pénible et passagère ; que les petites différences entre les vêtements qui couvrent nos débiles corps, entre tous nos langages insuffisants, entre tous nos usages ridicules, entre toutes nos lois imparfaites, entre toutes nos opinions insensées, entre toutes nos conditions si disproportionnées à nos yeux, et si égales devant toi ; que toutes ces petites nuances qui distinguent les atomes appelés hommes ne soient pas des signaux de haine et de persécution ; que ceux qui allument des cierges en plein midi pour te célébrer supporte ceux qui se contentent de la lumière de ton soleil ; que ceux qui couvrent leur robe d’une toile blanche pour dire qu’il faut t’aimer ne détestent pas ceux qui disent la même chose sous un manteau de laine noire ; qu’il soit égal de t’adorer dans un jargon formé d’une ancienne langue, ou dans un jargon plus nouveau ; que ceux dont l’habit est teint en rouge ou en violet, qui dominent sur une petite parcelle d’un petit tas de boue de ce monde, et qui possèdent quelques fragments arrondis d’un certain métal, jouissent sans orgueil de ce qu’ils appellent grandeur et richesse, et que les autres les voient sans envie : car tu sais qu’il n’y a dans ces vanités ni envier, ni de quoi s’enorgueillir.
Puissent tous les hommes se souvenir qu’ils sont frères ! Qu’ils aient en horreur la tyrannie exercée sur les âmes, comme ils ont en exécration le brigandage qui ravit par la force le fruit du travail et de l’industrie paisible ! Si les fléaux de la guerre sont inévitables, ne nous haïssons pas, ne nous déchirons pas les uns les autres dans le sein de la paix, et employons l’instant de notre existence à bénir également en mille langages divers, depuis Siam jusqu'à la Californie, ta bonté qui nous a donné cet instant.

Voltaire,
Traité sur la tolérance, Chapitre XXIII -
Oração a Deus - Versão


Portanto, não é aos homens que eu falo; é a ti, ó Deus de todos os seres, de todos os mundos e de todos os tempos: se é permitida a criaturas fracas perdidas na imensidão e imperceptíveis para o resto do universo, de ousar lhe pedir algo, tu que deste tudo, para ti cujos decretos são imutáveis como eternos, digne-se a olhar com pena os erros ligados a nossa natureza; que esses erros não façam nossas calamidades. Tu não nos deste um coração para nos odiar, e as mãos para nos degolar; façais com que nos ajudemos uns aos outros a suportar o fardo de uma vida penosa e transitória; que pequenas diferenças nas vestimentas que cubram nossos corpos débeis, entre todas as nossas línguas insuficientes, entre todos os nossos costumes ridículos, entre todas as nossas leis imperfeitas, entre todas nossas opiniões insensatas, entre todos os nossas condições tão desproporcionais aos nossos olhos, e tão iguais diante de ti; todas essas pequenas nuances que distinguem os átomos chamados homens não sejam de sinais de ódio e perseguição; que aqueles que acendem velas ao meio-dia para te celebrar suportem aqueles que se contentam com a luz do teu sol; aqueles que cobrem suas roupas de baixo com uma capa branca para dizer que é preciso te amar, não detestem aqueles que dizem a mesma coisa em um casaco de lã preto; é igual adorá-lo em um dialeto formado a partir de uma língua antiga ou um novo dialeto; que aqueles cujo traje é tingido de vermelho ou roxo, que dominam uma pequena parcela de uma pequena pilha de lama deste mundo, e que possuam alguns fragmentos arredondados de um determinado metal, desfrutar sem orgulho do que eles chamam de grandeza e riqueza, e que os outros os vejam sem inveja, porque tu sabes que não há nessas vaidades nem inveja, nem do que se orgulhar.
Podendo todos os homens se lembrar de que eles são irmãos! Que tenham horror à tirania sobre as almas, como tem execrado o banditismo que destrói pela força o fruto do trabalho e da indústria pacífica! Se os flagelos da guerra são inevitáveis, não nos odiemos, não nos dilaceremos uns aos outros no seio da paz, e empregar o momento de nossa existência para abençoar também em mil línguas diferentes, desde o Sião até a Califórnia, tua bondade nos concedeu esse instante.