quinta-feira, 18 de setembro de 2014

VIOLINO-POESIA E RABECA-POEMA - Crônica -



VIOLINO-POESIA E RABECA-POEMA - crônica –

Um poema é aquela poesia que queria que fosse uma rosa para lhe ofertar. Escolhi a nossa cor predileta - a amarela - das pétalas mais aveludadas que pude conceber; mas meu poema não é uma rosa. Tentará ser sempre um lírio, dos mais belos do jardim. Mas sei que você adora os lírios também...

Assim pensando, em não “tocar” poesia, não sabê-las dedilhar, não acertar sua afinação... Veio-me à lembrança uma frustração deixada nos tempos de adolescência. Por mais de três anos tentei ser um violinista, onde meu violino era a minha grande poesia. Mas não consegui dominá-lo. Ele também me recusou de todos os modos. Não nos demos bem. O “Príncipe dos Instrumentos”, sem o qual não existe sinfonia que evoque a beleza e a magia que só ele produz.

Todos os instrumentos são importantes, mas ele é inigualável. Sou um violinista frustrado, o que são três anos e tanto, frente aos doze anos para seu aprendizado? Fora as especializações e técnicas das muitas possibilidades instrumentais, conhecer seus irmãos de nova geração: os elétricos de cinco cordas, não só as quatro fundamentais, mi, lá, ré e sol. E os estudos diários, que serão para sempre.

Meu querido violino de madeira vermelha, modelo antigo... Não resistindo mais ver seu corpo sem alma, depositado em sua “caixa-ataúde” o doei a um aluno carente, lamentando sua despedida, seu adeus, não a minha atitude.

Foi embora com ele, boa parte da poesia que existia em mim. Ficou um vazio que precisava ser preenchido, como viver a vida sem um amor ao menos parecido? Vão-se as paixões ficam as ilusões. Sonhos sonhados e não realizados. Desejos e amores não almejados.

Estudando as histórias infantis mais a fundo, perscrutá-las com olhos e sentimentos aguçados, veremos que inúmeras, têm um grande poder formativo latente, psicodidático: quanto mais for o vetor de sua emissão e nossa captação em ver neles o “ensinando a aprender”.

“O pobre menino violinista”, tocando nas esquinas de um tempo barroco, para ganhar algumas moedas e levá-las para casa ajudar a sua mãezinha... Foi (hoje analisando pela psicodidática), uma história que mamãe me contava, até como recurso comovente de convencimento, a matricular-me a seu gosto, no Conservatório Musical, trocando o futebol no “Campinho da enxada” e a natação no “Tancão” – um represamento de um riacho - pelas três “infindáveis” horas de violino diárias, menos o domingo e “dias santos”. Mais ainda as lições de casa. Depois, tomei gosto. Até ia ter aulas de reforço com o maestro Vicente Muniz que regia sua orquestra homônima.

- Por que esta crônica inclui a história de um violino? - Porque não produzo poesias da mesma maneira que não faço música. Sou um teórico musical frustrado, como se pela minha vida tivesse passado um grande amor não correspondido.

Para acalmar a frustração fui à Iguape. Lá se fazem rabecas – originais – de forma artesanal. As mesmas usadas nas Festas do Divino (Espírito Santo), padroeiro da cidade. Comprei minha rabeca-poema. Ela não é tocada do mesmo jeito, nem possui o mesmo som agudo do violino-poesia. Toca-se apoiada ao peito. Seu som fanhoso mais parece um lamento tristonho, saído do fundo da alma. Alma que não necessariamente sofre por amor ou dor, apenas vive por uma fé, no dançar e cantar desse povo simples, caiçaras, autodidatas que elevam aos céus seu canto-poema.

Como disse Cecília Meirelles: “Não sou alegre nem sou triste: sou poeta”. Não toco violino-poesia; tento tocar rabeca-poema.

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