PROSA PARA
PENSAR O ADEUS... A um eterno Amor.
Lembremo-nos que por vezes, necessitamos de dizer, ainda que por
metáforas e parábolas - assim sem se constranger - o que nos é retido na alma.
O intransigível existe e contrapõe-se ao nosso campo de emoções positivas, por
vezes superáveis, outras nos levam junto ao objeto do amor que se foi.
As pessoas que mais amamos - às vezes achamos - que são as que mais nos
decepcionam nos causam espanto ou surpreendem; por julgarmos que são, ou
deveriam ser perfeitas e esquecemo-nos fragorosamente que são humanas.
E nisso somos inquietos, imediatistas, egocêntricos e incompreensíveis,
na maioria das vezes. Em estudo de causas, se verifica que os desenlaces
afetivos recaem sobre esse fato, de partirmos do princípio que (nós) somos
produtos acabados, protótipos aos demais semelhantes e que (os outros) nos
façam felizes, quando quisermos e não quando eles estiverem também, sido feitos
felizes. É isto que escapa aos relacionamentos afetivos e os dentes da
engrenagem emocional não se encaixam.
Porém a vida muitas vezes paradoxal, tornasse-nos uma atividade de
campo experimental. Somos testados, passados por fogo e caudais. E calculo que
realmente seja.
Temos que nos temperar. Diz a lenda do Rei Artur, que o mistério do
poder de sua mística espada Excalibur, estava em sua têmpera. Essa lhe dava
alma. Nesse entendimento é a inquietação do amor que dá a têmpera e a alma ao
universo; o movimento eterno. É a vertigem do amor que faz girar os mundos.
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Se pudéssemos... Ah, se pudéssemos
retroagir todas as voltas da espiral do tempo e reencontrar aquele grande amor,
isento de culpas, como um dia fôramos os dois... E reiniciarmos a contar as
estrelas do ponto onde paramos... No silêncio da noite, a neblina nos
evolvendo, a lua viajando serena entre nuvens rendilhadas, no céu polvilhado de
pó de prata. Tu buscando abrigo e calor nos meus braços. Estava tão fria a
noite... E ao longe alguém talvez amando como nós, ou sofrendo a ausência de
seu amor ao som de um violino cantava – no silêncio absoluto da noite – esta
canção:
Queima no
deserto o inclemente Sol,
Iluminando
mais um dos dias esvaídos
Entre dunas
e planuras intermináveis...
Minha alma
queima a última chama
Para
chorar-te sob um céu de estrelas.
Solidão! Meu
horizonte é o vasto mundo,
A Levar
consigo meus sonhos e deixas,
Flano asas
em busca de tua imagem
Viva, sobre
a aridez deste meu corpo.
Teu perfume,
flagrante lembrança reserva,
E do cansado
lamento eu faço segredo.
Tu serás meu
refrigério, meu encanto,
Meu celestial
poema no tórrido deserto.
Meu oásis;
rainha de soberana calma,
Sombra de
tamareiras, para minh’Alma!
Ah! Se pudéssemos retornar à grande árvore
encantada, coração do jardim de nossos sonhos, descontaminados de todos os
pecados que aderiram aos nossos corpos e afetaram nossas almas; modificaram
nossas vidas, nossos caminhos, nossos ideais. Ah! Se pudéssemos voltar...
Estarmos tão puros como ao tempo em que
conversávamos em silêncio, por olhares. As batidas do coração comandavam nosso
desejo e a emoção. À aproximação de nossos rostos, os corações aceleravam-se,
antecipando o beijo e as carícias; intensificava-se teu inconfundível aroma.
Teu rosto se aquecia, tua respiração se entrecortava seu hálito era perfumado e
quente. Ingressava-me em outro mundo paralelo, do qual não queria mais voltar,
queria que se transformasse em um labirinto do qual jamais acharia o retorno.
Ali construiríamos nosso mundo, um universo de sonhos. Apossava- me um encanto
místico, um sentimento de todo não revelado. E eu indagava solenemente a ti:
- És às vezes indecifrável, enigmática...
Isto me faz teu curioso prisioneiro, refém da busca, da procura de teu
interior. Teu exterior, Tua beleza, me seduzem profundamente. Mas que pensas de
mim? O quanto pensas em mim e por onde
andas e o que fazes quando estás sem mim? O que almejas da vida seria o mesmo
que eu? Por que buscavas a mim no começo de tudo, com tanta insistência amor e
sofreguidão?
< >
O notável era minha total abstração do
desejo de posse de sua liberdade ou o tão desgastado significado [para mim]
deste sentimento menor: o ciúme. Meus pensamentos transitavam em outras
esferas, embora ainda fossem lá misteriosos os caminhos para mim.
Porém, a cada encontro toda a mágica se
refazia. E eu temia pela sua ausência física. Mas nunca lhe falava desses meus
pensamentos. E procurava sempre os assuntos mais alegres, leves e condizentes
com a felicidade daquele encontro. Nunca existiu um único desentendimento ao
longo de nosso relacionamento.
O tempo que passava contigo, seria o mesmo
tempo cronológico do mundo? Passavam-se horas cronológicas e a teu lado apenas
mero segundo. Sentia em minha alma uma sensação de vazio, quando só. Misto de
dúvida, afeto e amor. Mas de incompletude. Minha alma estava começando a ficar
desolada em separado, necessitava de sua alma junto a mim. E eu próprio me
recolhendo da vida lá fora.
Relutava contra um poderoso e avassalador
sentimento, que seria um sofrimento
prolongado, amor excessivo fora das raias da razão. Sabia ainda, que seria uma
desmedida paixão que recairia em um possível desgosto, e desalento
profundo.
Enquanto diagnosticava esses sinais em
mim, não percebia “clinicamente” os mesmos sinais nela. Pensei no que a lógica
da psicologia afirma: "As pessoas são diferentes..." Sim. Por isso
este relato! Caso não o soubesse não teria meios para essas análises paralelas.
Descobrira que as pessoas não só são diferentes, como pior, nem sempre
congruentes nos finais de sonhos em comum.
Era ainda esse desconforto, é claro,
apenas uma sensação. Mas incômoda. Como nos sonhos, o tempo ao lado dela se
desenrolava revelando todo o enredo de nossas vidas. Passado, presente e
futuro, pareciam sair da abstração e se materializar em um só fenômeno que não
parecia estar caminhando para a ¹Eucatastrofe.
Muitas vezes abraçados, tinha dentro de
mim um sentimento enorme de ternura, quando ela repentinamente tinha um suspiro
curto e sentido. Essa reação que remete ao campo das emoções, sempre me foi de
difícil compreensão. Talvez por ser uma das coisas que nunca ousamos emitir
perguntas sobre a razão. Apenas elas existem e até emolduram uma noite de céu
muito estrelado, envolta no intenso perfume de “damas-da-noite”.
Este cenário, sempre ao atentarmos bem, ele
fica místico.
Ela para mim, deixavas de ser real e
comigo entrava em outra dimensão. O nosso amor, envolvia-nos em um turbilhão e
nos levava a estágios e pousos de encanto e beleza. Éramos, tomados de uma
profunda paz, difícil de descrevê-la. Mas nunca a via sorrindo amplamente,
sempre um sorriso esboçado e contido. Não era tristeza, mas era algo que... não
oferecia resposta satisfatória para meu íntimo.
Os pensamentos, que me vinham queimando em
chamas, eram por ela rebatidos com afagos suaves, carinhos e meiguice leve.
Ficávamos sem palavras, no silêncio - ajeitava-lhe os longos cabelos,
alisando-os com as mãos, percorrendo levemente com os dedos os traços lindos de
seu rosto, sua boca, seus lábios, contornando-os como se estivesse desenhando
uma obra de arte.
Sua beleza irradiava-se com extrema
naturalidade, de cabelos negros bem longos, corte reto; olhos castanhos, magra,
não tão alta a ponto de não poder usar saltos “quinze”.
Sem nenhuma
das características que marcam as grandes belezas feitas pela mídia (as louras,
as ruivas de olhos azuis etc.). Mas ela era, com o conjunto desses traços, de
uma forma tão bem distribuída que a faziam a jovem, a mulher, mais linda que já
conheci.
Seus olhos castanhos eram profundos,
pareciam ler meu interior, suas sobrancelhas eram usadas praticamente ao
natural, sua boca de dentes perfeitos tinha os lábios perfeitamente delineados,
e sempre com batom cor- de- carne, com pouco brilho ou opaco. Seus únicos
adereços: um anel, uma pulseira de corrente dourada, e um inseparável medalhão
preso a uma corrente longa de ouro dourada.
Ao ser afagado, recebendo seus meigos
carinhos, no íntimo eu cismava como se existisse algo acontecendo ou uma
barreira invisível em nosso relacionamento. Procurei não pensar mais nisso. Só
que, minha imaginação foi se transmudando de abstração para realidade ao correr
do tempo. Aqueles carinhos e meigos afagos foram diminuindo de intensidade
emotiva. Sentia que não havia “alma” nos abraços, nos beijos. Sentia haver
ainda que levemente, um quase imperceptível afastamento. (Só percebido pelos
exercícios de meu pensamento).
Não mais suportando as dúvidas e o grande
incômodo que vinha sentindo e os pensamentos que de todos os tipos me assolavam
a mente, eu pergunto-lhe se estaria algo afetando os sentimentos em relação a
nós... Ela possuía várias características que eu bem conhecia: sinceridade era
uma delas; era verdadeira; fiel; sincera; orgulhosa e altiva quando precisava
ser. Sabia que me amava de forma extrema quando começamos o namoro. [E pensar
que eu antes a ignorava.]
Era educada e gentil para comigo, sempre.
Mesmo sem respostas; aprendemos a decifrar silêncios. Conclui minha pergunta de forma simples: - Por quê?
- Porque é preciso! - Responde ela com
surpreendente serenidade.
- Explique-se, por favor! Seja mais
conclusiva. – disse-lhe.
Respondeu-me: - Porque precisamos contar mais estrelas,
assistir mais pores- de - sol, nos vermos em meio a mais neblinas de rigorosos
invernos, caminharmos sob a chuva fria, dividirmos as mudanças das estações da vida,
para podermos compor nosso poema ideal...
Falava como se estivesse perscrutando a
própria alma. Seu olhar era distante, em um horizonte há anos luz de onde
estávamos. Como se em seu coração houvessem instalado uma tábula com uma
inscrição profética. Era uma sacerdotisa apocalíptica, estava a anunciar vários
fins: o meu, o dela, de nossos sonhos mais alentados, a existência de um amor
sem precedentes, sem medidas. Eu ia além do amor, a venerava.
Mas estava a dizer-me adeus? Foi isso que
entendera! Ela me amava era certo, mas não podia dizer que ela era daquelas
criaturas que poetizam tudo ou filosofam a todo o momento. Era bastante
parcimoniosa com seus sentimentos pessoais. Demonstrava fortemente suas emoções
por atos e atitudes.
Essas palavras, não eram de forma corrente
usuais dela. Embora fosse muito inteligente. Talvez usasse menos palavras, por
sua área escolhida ter sido das exatas que a faziam mais racional, ou por ela
ser assim, ter escolhido iniciar-se nesse campo das ciências. Enquanto eu fui
para o magistério ela foi para a contabilidade.
Choramos. Ela chorou muito! Soluçava
convulsivamente. Mais explicações não houve. A inteligência e a racionalidade
não foram feitas só para constar dos verbetes, foram descobertas para
direcionar as pessoas. Temos que saber como agir e se portar diante do
inevitável.
Fatidicamente foi um inacreditável adeus!
Amigos em comum ficaram abismados, sem acreditar que isso tivesse acontecido...
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Porém para dois corações apaixonados, não
nos esqueçamos de que é da vida cruzar desertos. A busca sempre será a de um
oásis onde predomine a verde esperança do poço de águas cristalinas. O perigo é
a armadilha da enganosa miragem.
Procuramos na aventura da vida, a boa
ventura da fonte encontrar, para que dela bebamos e sejamos abençoados.
Mas os
desígnios do amor nem sempre exige de uma das partes o risco de lançar-se ao
desconhecido caminho sem olhar para trás. Nem sempre um dos que se amam - se
propõe a acreditar - que se lançando por amor às chamas, ao sumidouro do mar,
ao abismo- sem- fundo, possa à vida retornar.
Foi no primeiro obstáculo, o do deserto,
que ela titubeou. Claro que achei normal, tão jovem e frágil em não confiar que
eu, apesar de amá-la acima de todas as coisas do mundo, pudesse vir a provê-la
de um manancial em pleno deserto!
Não
conseguiria jamais fazê-la ser a mesma outra vez. Tinha a certeza!
Como escrevi depois:
- Tornastes uma estrela que se apagou
dentro de mim - só tua luz resta a percorrer o universo de minha alma. Não se
reconstrói uma estrela jamais. Só a sua luz permanece para toda a eternidade!
Por isso fico com tua luz, tua lembrança. Adeus!
Somente por amor e tão somente, é que nos
lançamos aos percalços da vida, com a alma em pedaços, mas sem olhar para trás.
Só a soma de dois grandes amores constrói uma paixão, que nos faz morrer por
muito amar! Mas aí a vida se refaz e a morte passa a não existir: ser um
engodo, uma mentira, frente àquela única verdade o indiscutível e verdadeiro
Amor! Morre a estrela fica a sua luz, ali presente a viajar na imensidão do
Universo eternamente. Ela não existe mais. Morreu há séculos, milhões de anos,
mas ela está presente sempre vista por nossos olhos, sentida por nossa alma,
refletindo seu brilho em nosso coração.
Cerca de quatro anos se passaram depois
daquela resposta às minhas perguntas - quando naquela ocasião ela respondeu:
“Por que é preciso!”
[...]
“Contarmos mais estrelas... Nos vermos em meio a mais neblinas de rigorosos
invernos”...
Nada mais tenho a lhes relatar... Sinto-me
vazio de ânimo, espírito e palavras.
Palavras... Palavras... Palavras. Como todas frente ao inaceitável soam sem
sentido! Como são destituídas de espírito, fracas, sem importância ou significado...
É quando compreendemos a força do silêncio, que tem o poder de matá-las...
Acredito que minha alma falou por mim. Só
lhes acrescento e justifico a razão de minha não aceitação da impotência perante
as forças do irreversível...
Houve um acidente de trânsito no Estado de
Santa Catarina, a serviço da empresa multinacional em que ela estagiava.
Seu
colega que dirigia o veículo, e outra funcionária que seguia no banco traseiro,
foram ambos para a U T I de um hospital do município e se salvaram.
Ela faleceu
no local.
< IN MEMORIAM >
Fique em paz eterna amada.
Ocultarei em meu coração seu nome.
Que os Anjos lhe transfiram toda a
saudade,
O amor e o carinho que lhe dedicarei
em vida e pela eternidade.
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“Não criei
personagens. Tudo o que escrevo é autobiográfico. Porém, não expresso minhas
emoções diretamente, mas por meio de fábulas e símbolos. Nunca fiz confissões.
Mas cada página que escrevi teve origem em minha emoção”
(Jorge Luís Borges).
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