sexta-feira, 14 de março de 2014




                                                            O PÁSSARO E A ROSA
O Sol começava a  emitir seus primeiros clarões no céu, tingindo as nuvens de variadas cores, impossíveis de serem imitadas pela palheta de um artista, dada tanta luminosidade e inimitáveis matizes. Tons rosas-pastel, lilás, amarelos, esverdeados, cinzas claros e mais escuros, até intensificar em dourado, mais e mais, conforme se via no horizonte longínquo. Já fazia algum tempo que os primeiros raios do Sol haviam rasgado a escuridão da madrugada, e então nascendo, o Artista começava a tingir o céu com ele, usando-o como pincel, nas mais intensas cores. O espetáculo era deslumbrante e o Artista - todos os dias o renova - para que nossos olhos se maravilhem constantemente com novas paisagens e cores inimagináveis de tanta beleza. Gradativamente o céu foi ficando mais e mais brilhante, passando do ouro à prata reluzente, e aqui e mais distante uma elevação, uma colina, uma montanha, ainda mantinha o claro-escuro não totalmente desfeito pelo pincel solar. Pronta a obra diária, o céu muito azul como águas cristalinas de uma enseada tranquila, deixa-se recortar por formas e silhuetas.

 Nisto, um pássaro em voo ágil, desceu das alturas e flanou suas asas em direção a um solitário templo. A velha igreja tinha um jardim interno com uma fonte, alimentada por uma nascente local. O pássaro alçado seu vôo em direção às muitas partes avariadas da construção, adentrou  o santuário  afim de aplacar a sede. As paredes do templo, mantinha-se coberta por muitos espelhos. No interior daquelas ruínas, pessoas de boa índole e fé, ainda mantinham uma pia com água, para algum eventual batismo. Já que, nas imediações existia uma aldeia, e de tempos em tempos ali vinha um sacerdote, exercer seu serviço teológico à pequena população e eventualmente algum batismo, ou ofício fúnebre. Sempre uma ou outra mulher piedosa colocava umas flores num jarro com água para o deleite dos olhos dos fiéis, quebrando assim o ar de desalinho e destruição que o tempo e as guerras haviam causado àquela que fora um dia uma catedral anglicana. As flores no entanto, se refletiam nos espelhos das paredes da capela onde adentrara o pássaro, e o confundia com as janelas, por onde se avistavam as flores lá fora, iguais as que no jardim, as mulheres colheram.

Pobre pássaro, totalmente confuso, começou a lançar-se contra os espelhos, imaginando em seu pequeno cérebro que fossem janelas, e a cada batida nas paredes foi ferindo-se mais e mais.

Incansavelmente, arfando, até que não resistiu mais às pancadas sofridas e seu corpo frágil deixou de voar, arfar e viver. Ironicamente caiu morto dentro da pia batismal onde foi buscar o lenitivo para não morrer de sede. Assim, buscando aplacar a sede, o inocente e pequeno pássaro ficou muito assustado com a multiplicidade de imagens que se desdobraram à sua frente. Não conseguiu discernir o real do ilusório, sua sede era real, física, de todos os seres vivos, buscou um lugar onde existisse o essencial à manutenção de sua vida, e assim inadvertidamente a perdeu. As mulheres piedosas fizeram seu papel e sentiram a morte do pequeno pássaro. As crianças choraram nos braços das mães e das avós ao verem o pequeno ser já inanimado.

O velho sacerdote, mediante tal cena viu descortinar-se em sua mente, treinada pelo tempo e pela vida pastoral, uma imagem, uma quase parábola do Mestre, a qual poderia ser transmitida àqueles humildes aldeões, como um sermão. Passou a dizer: - "Em todos nós filhos de Deus que já temos discernimento, encontra-se gravado aquilo que é real e aquilo que nós adquirimos pela vida a fora. Há os adultos que possuem maior conhecimento dos fatos, outros existem que ainda não se deram conta da vivência, são menos laboriosos no entendimento. E, há ainda os bem jovens as crianças em formação, daí a responsabilidade dos pais, que se descuidarem em lhes passar os valores sagrados dos mandamentos divinos, serão cobrados disso, aqui nesta Terra ainda, pelo desgosto de verem seus filhos perdidos pelo mundo, como ovelhas desgarradas, que já foi observado pelo Santo Mestre na parábola da ovelha perdida.

Bem dizendo: temos em nosso íntimo, no fundo da alma, junto ao real e aquilo possível de ser  adquirido, o essencial; e aquilo que é aparente. Parece, mas não é. Brilha, mas não é ouro. É mulher bonita, mas ardilosa. O moço incauto a busca apaixonado pela sedução, “passeia na sua calçada”- diz a palavra sagrada - mas é mulher casada cujo marido está longe, mas eis que ele volta sem dar conta e o moço é abatido como um cão sem dono.

Eis o que é aparente, mas não é real nem essencial. A busca de viver em paz com seus semelhantes consiste em estar caminhando no bem exterior ao coração, à sua alma, para a satisfação do Santo Espírito do Mestre que deve viver em nós. Disto resulta a paz de espírito. Não podemos harmonizar uma vida correta no mundo exterior, sem ter a paz interior. Ambas se complementam.
Se meus amados aqui presentes, puserem toda sua energia, sua força para zelar só das aparências, das vossas imagens, como se isso fosse a parte central formadora de suas personalidades, da razão de suas vidas, consumirão seus dias escravizados, acorrentados como nas masmorras, por causa dos reflexos do falso ouro, da falsa mulher, do falso homem, enfim das enganações do mal e morrerão como o rapaz seduzido pela mulher ardilosa.

A mocinha sem marido, com um bebê mamando, outro chorando e outro pedindo o que comer. O que é isto? São seus dias consumidos no reflexo que o pássaro que ora vos emociona imaginou. O pássaro imaginava estar saindo para a liberdade, assustado, quando viu os amados estarem chegando. Assim não deveis estar cativos dos reflexos, e de rosto virado para a luz divina e sua natureza bendita e real, ou da sua verdadeira essência. Chocar-se-ão contra duros espelhos postados em paredes de pedra.

Meus queridos e amados irmãos, meu caminho foi longo, portanto o final da jornada se faz breve. Atentai para minhas palavras, que na verdade não são minhas, mas do mestre do qual sou mero instrumento: vós precisais reconhecer fazer perfeita distinção entre o que é acessório, supérfluo, e o que contém a verdadeira substância vital. Façam meus amados um exercício mental diário por meio de orações. Falem com o Pai Eterno, perguntem o que é melhor para suas vidas, peçam o discernimento entre o que é certo e o que é errado, o que é do bem e o que é do mal. Busquem se recuperar - porque todos nós pecamos e precisamos do perdão de Deus - buscando o "Eu" verdadeiro, não o de fachada, aquele que se mostra em praça pública, retirem as máscaras de bufões. Só assim as verdadeiras flores não os enganarão como miragem ou reflexos de um espelho. A rosa do conhecimento se abrirá gloriosa dentro do coração de cada um de vós meus amados irmãos.

Que Deus em toda sua glória, discernimento, justiça e bondade possa abençoar minha boca, minhas palavras e seus ouvidos e que estas sementes de flores possam germinar como se o Semeador as tivesse lançado em terra fértil.
 E como o velho sacerdote e pastor anglicano fosse de descendência grega pronunciou, "que seja tudo em nome de:

                ICHTHYS - IESOUS CHRISTOS THEOU YÍOS SÔTÉR

                        Jesus Cristo, Filho de Deus, O Salvador

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